Tabagismo Gestacional como fator de risco para o TDAH

logo1O dia 31 de Maio é considerado “Dia Internacional contra o Tabaco”. Neste período geralmente se intensificam as campanhas de conscientização, informando à população o quanto o tabagismo pode provocar insuficiências respiratórias, entre outras complicações. Contudo, as campanhas poucas vezes difundem os efeitos neuropsiquiátricos e neuropsicológicos que o fumo (durante a gestação) provoca no feto. Um desses efeitos mais estudados e corroborados por evidências científicas em muitos estudos com diferentes populações é em relação ao TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).

O TDAH, como toda doença multifatorial, pode ter muitas origens diferentes. Neste texto, especificamente, duas delas serão comentadas. Uma é a genética, ligada principalmente ao polimorfismo dos genes: DRD4 e DAT-1; enquanto a outra é teratógena, ligada principalmente à ação de determinadas substâncias circulantes no organismo da mãe, sobre o embrião ou feto. Um destes fatores teratógenos que possibilitam a manifestação do TDAH na criança é o tabagismo.

Segundo Braun, et al (2006), dependendo do sexo, o feto reage de forma diferenciada à exposição intra-uterina das substâncias do cigarro. O sexo feminino parece ser mais propenso a desenvolver o TDAH devido ao fumo, por isso, considera-se a probabilidade de 4 a 6 vezes mais chance de uma menina exposta ao tabaco durante a gestação, desenvolver o TDAH (em comparação com meninas não expostas). Quanto ao sexo masculino, considera-se que um menino exposto às substâncias do cigarro durante a gestação tenha, em média, 2 a 3 vezes mais chance de manifestar o TDAH (em comparação com meninos não expostos). De qualquer forma, estatisticamente considera-se que crianças cujas mães fumaram durante a gravidez têm de 2 a 5 vezes mais chance de desenvolver o TDAH.

De acordo com Button, et al (2005 e 2007) uma das substâncias do cigarro que é responsável pelo comprometimento no desenvolvimento fetal é a famosa nicotina, que parece ativar os genes para o TDAH que os fetos portavam, mas que estavam inativos. Outra de suas ações é a de provocar uma diminuição no fluxo de aminoácidos para o feto, que não se desenvolverá da forma esperada. Além, é claro, de a nicotina ter aquele conhecido efeito de diminuir a fome do fumante, nesse caso: a mãe. Menor quantidade de comida ingerida, menor quantidade de nutrientes para o bebê, mais comprometido será seu desenvolvimento.

O monóxido de carbono ingerido pelo cigarro, também poderá alterar o desenvolvimento do bebê, uma vez que a hemoglobina tem grande afinidade pelo CO, e quando este está em quantidade elevada no organismo, formam-se muitas carboxihemoglobina (hemoglobina ligada ao monóxido de carbono). Esta, por sua vez, será transmitida para o feto via cordão umbilical, o que pode, como consequência da maior concentração de CO no organismo do feto, causar quadros de apnéia, até 90 minutos depois de o cigarro ter sido consumido. Estas repetidas diminuições na oxigenação do feto podem provocar pequenas lesões cerebrais, que na infância podem se manifestar como TDAH (Erns, et al, 2001).

Evidentemente, ao estabelecer esta correlação, leva-se em consideração tanto o número de cigarros consumidos pela mãe, como também o período em que eles foram consumidos. Geralmente constata-se que os 3 últimos meses da gestação sejam os mais críticos, e que a gravidade da psicopatologia será diretamente proporcional à quantidade de cigarros consumidos.

Uma das dificuldades que a maioria dos artigos cita é separar o que é um TDAH causado pelo fumo durante a gestação, e o que é um TDAH hereditário. Isso porque, devido à ação estimulante da nicotina, muitas pessoas (de ambos os sexos, mas principalmente as mulheres) que possuem o TDAH recorrem ao tabagismo como uma forma de auto-medicação (LINNET, et al, 2005). Então, é bem possível que uma grande quantidade das mães fumantes, sejam também mães portadoras do transtorno.

Desta forma, Obel, et al (2008) propõe que: em sociedades onde o consumo de cigarro seja perfeitamente permitido, há mais probabilidade de que um número menor de pessoas o estejam usando como auto-medicação – ou seja, mulheres que tenham TDAH – pois a grande maioria usa simplesmente pelo prazer da droga. Em sociedades onde o uso do cigarro é condenável, espera-se que as pessoas que façam uso dele, façam realmente como auto-medicação, existindo, portanto, uma quantidade menor de pessoas que “fumam pelo simples prazer de fumar”. Logo, os estudos realizados com populações onde é permitido o fumo, podem demonstrar a associação entre TDAH e cigarro durante a gravidez, como fruto do fator teratógeno, pois nessa população espera-se que haja uma expressividade menor de mulheres com TDAH. Já as pesquisas realizadas em comunidades avessas ao cigarro, é provável que o resultado obtido se refira mais à genética herdada, do que à exposição ambiental intra-uterina.

De qualquer forma, o tabagismo gestacional é um fator ambiental reconhecidamente responsável pela manifestação do TDAH na infância e, com base nisso, conclui-se que as campanhas também devem difundir essa informação, para que – ao menos durante a gestação – as mães possam abrir mão dos prazeres do vício, em prol de uma melhor qualidade de vida da criança que está gestando. Isso, evidentemente, não irá erradicar o TDAH, mas com certeza diminuirá significativamente a sua incidência.

Thales Coutinho, acadêmico do 4º ano do curso de Psicologia e responsável pelo website de divulgação científica: http://www.psye.com.br

REFERÊNCIAS

  1. RIESGO, Rudimar. ROHDE, Luis Augusto. Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. In: IZQUIERDO, Ivan. KAPCZINSKI, Flávio. QUEVEDO, João (orgs). Bases Biológicas dos Transtornos Psiquiátricos. Porto Alegre: ArtMed, 2004.
  2. BRAUN, Joe. KAHN, Robert. FROEHLICH, Tanya. AUINGER, Peggy. LANPHEAR, Bruce. Exposures to environmental toxicants and attention deficit hyperactivity disorder in US children. Environ Health Perspect, vol. 114, 2006.
  3. BUTTON, Tanya. MAUGHAN, Barbara. MCGUFFIN, Peter. The relationship of maternal smoking to psychological problems in the offspring. Early Hum Dev, vol. 83, nº 11, 2007.
  4. BUTTON, T. THAPAR, A. MCGUFFIN, P. Relationship between antisocial behavior, attention-deficit hyperactivity disorder and maternal prenatal smoking. British Journal of Psychiatry, vol. 187, 2005.
  5. ERNST, Monique. MOOLCHAN, Eric. ROBINSON, Miqun. Behavioral and Neural consequences of prenatal exposure to nicotine. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry, vol. 40, nº 6, 2001.
  6. LINNET, Karen. WISBORG, Kristen. OBEL, Carsten. SECHER, Niels. THOMSEN, Per. AGERBO, Esben. HENRIKSEN, Tine. Smoking during pregnancy and the risk for hyperkinetic disorder in offspring. Pediatrics, Vol. 116, nº 2, 2005.
  7. OBEL, Carsten. LINNET, Karen. HENRIKSEN, Tine. RODRIGUEZ, Alina. JARVELIN, Marjo. KOTIMAA, Arto. MOILANEN, Irma. EBELING, Hanna. BILENBERG, Niels. TAANILA, Anja. YE, Gan. OLSEN, Jorn. Smoking during pregnancy and hyperactivity-inattention in the offspring – comparing results from three Nordic cohorts. Int J Epidemiol, 2008.
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